quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

 

 
                       CASTELO DE ALMOUROL
 
Vem de lá bem longe, da bruma dos séculos,
De um tempo antigo de demorada lembrança,
Façanhoso, alcandorado na sua jangada de pedra,
Rasgando o rio, atento e vigilante, hoje guardião do nada.
Nas suas muralhas ecoa, ainda, o desespero dos vencidos,
E o grito de vitória dos que lhe ultrapassaram a porta.
Lendária morada de gigantes e de mouras encantadas,
Palco de muita e inúteis lutas, goza, agora, da paz eterna
Num demorado sono em seu solitário eremitério.
Achei-me há dias - e só num sonho podia ter sido -
Remando novamente, rio acima, até aquela ilha.
Na noite escura, a lua cheia brilhava intensamente.
Galgada a escadaria esboroada pelo roçagar do tempo,
Penetrei no vazio imenso do castelo e chamei gritando:
Ramiro, Beatriz, Misaguarda, Polinarda!?
No alto das muralhas o vento afagava as ameias
E, naquele silêncio angustiante, ninguém me respondeu.
Se procurardes, no falar daquelas pedras, a razão das coisas,
Elas dissertarão sobre a verdade factual que faz a História.
Mas eu, que procuro no choro pungente dos salgueiros,
Um motivo justificado para esta minha nostalgia,
Oiço apenas o sussurro brando do rio que corre remansoso
 
 

 
 

domingo, 16 de fevereiro de 2014


    PETIÇÃO AO MARQUÊS
 
        

Desculpa-me Marquês esta insolência,
Ao descrever-te em verso mal rimado,
Nosso País, agora em decadência,
Que vive pobre e um tanto mal tratado.
 
 País enorme em tempos de decência
 É, agora, um quintal mal-amanhado,
 Que pede esmola em estado de insolvência
 Já sem orgulho e meio envergonhado.
 
A bandalheira é tanta que entristece,
Muito lixo, demais a sordidez,
Tudo é confrangedor e envilece.
 
Falta gente capaz, do teu jaez,
Por isso olha o País que esmorece,
E, assim que puderes, volta Marquês!

 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

                                             Constância é uma vila extremamente airosa que, em anfiteatro, desce lá do alto para se debruçar sobre a confluência dos rios Tejo e Zêzere, num cenário de peculiar beleza. Das várias vezes que a visitei, pondo de parte a panorâmica que nos encanta, há duas peculiaridades que me inspiraram os "desabafos poéticos" que se vão seguir. O primeiro refere-se à estátua de Luiz de Camões ali existente. O poeta está sentado com um livro no colo, veste à época, mas tem os pés descalços. O que terá  querido dizer o escultor com tamanho desconchavo? Interrogo eu nestas minhas redondilhas:

                                                                      


 
"MEU CANSADO SOFRIMENTO "

 

 

Ao Constância visitar
Que espanto não foi o meu,
Ver o Camões ali estar,
Sentado de pés ao léu.

 
Teria havido um percalço,
Ou devaneio do escultor?
Estar ali de pé descalço,
Não será pouco rigor?
 
Camões à beira do rio,
Em situação de revés,
Mesmo no Inverno frio,
Ia ali molhar os pés?
 
Dos joanetes sofria,
Ou estaria tão cansado
Que se sentou, quem diria,
Tendo os sapatos tirado?
 
 Que a micose causa abalos,
Toda a gente sabe disso,
Também sofria dos calos,
Ou picou-se num caniço?
 
Talvez fosse matacanha,
Pegada no Oriente,
Ponho estas questões sem manha,
E a dúvida é pertinente
 
Mas não vi nenhum calçado
Ali ao pé da escultura.
Os sapatos, desgraçado,
Deixaste-os na sepultura?
 
Não quero aqui ser profeta
Somente venho alertar:
Calcem mas é o poeta,
Que se pode constipar!
 
                  
                                       O meu segundo "diferendo" vem do facto de eu ser um      indefectível opositor da ideia de se aprisionarem animais, sejam eles  quais forem, como  forem, ou a que pretexto  forem. Talvez por ter andado por África e ter visto aquela ainda imensa e variada bicharada movendo-se em infindáveis planícies (tandos), criei este conceito de que a nossa Mãe Natureza não criou tanta variedade de bichos para estarem metidos em jaulas e gaiolas. E foi o que quis dizer nestas minhas quadras: 
 
      
            LIBERTEM AS BORBOLETAS!
 
 
Novo Almourol diz então:
Em Constância, (custa a crer),
Fizeram uma prisão,
Prás borboletas meter.
 
Para não ferir a mente,
Num  gesto discricionário,
Deram-lhe um nome eminente,
Que nem está no dicionário.
 
Seja o nome lá que for,
É sempre uma coisa feia.
Para mim causa horror
Ver insetos na cadeia.
 
Constância é meu percalço,
Faz-me sempre confusão:
O Camões de pé descalço,
Borboletas na prisão.
 
A nossa Mãe Natureza,
Pô-las no mundo animal,
Pra mostrar sua beleza
Em liberdade total.
 
Exijo pois, sem demora,
E não me venham com tretas,
Quero os insetos cá fora,
 LIBERTEM AS BORBOLETAS!